Olá,

“Em qualquer país do mundo que não esteja em guerra, uma atuação de agentes do Estado que provocasse mais de 100 mortos seria considerada uma tragédia histórica, um marco para repensar a atuação estatal, um motivo para abrir comissões parlamentares de inquérito que permitissem entender a catástrofe e evitar sua repetição”. 

É com esta constatação trágica e óbvia que se inicia o artigo do sociólogo Ignácio Cano, da UERJ, sobre a operação policial no Rio de Janeiro na última terça-feira 28, que deixou o País e o mundo estarrecidos. Sob o pretexto de tomar o "quartel geral" do Comando Vermelho nos complexos da Penha e do Alemão, as forças de segurança deixaram um rastro de sangue como nunca havia sido visto no estado. 

“Trata-se da repetição, numa escala mais elevada, da velha estratégia de invadir territórios dominados pelos grupos criminosos, matar suspeitos, apreender algumas armas e drogas e sair depois para retornar alguns meses depois e repetir o ciclo”, escreve Cano. Uma estratégia que nunca conseguiu desarticular as facções criminosas, mas comprova a velha tradição da segurança pública no Brasil de dobrar a dosagem quando o medicamento não mostra os efeitos desejados.

No próprio dia do massacre no Rio e nos dias que se seguiram, nossa equipe buscou especialistas que nos ajudassem a explicar as causas deste espetáculo macabro de violência. Publicamos um texto do cientista político Pablo Nunes, coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), outro texto do sociólogo José Cláudio Souza Alves, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, e ainda de Robert Muggah, do Instituto Igarapé.

A exposição dos corpos de jovens negros brutalizados pela ação policial é o tema do artigo “Pornografia da morte: o Brasil que naturaliza e celebra imagens de violência racial”, da pesquisadora Leilane Menezes Rodrigues, doutora em Mídia e Informação pela Michigan State University. “A existência de uma imagem explícita de violência, por si só, não garante que a mídia humanizará a vítima. Frequentemente, vê-se o oposto: narrativas que reforçam o racismo para justificar a brutalidade”, escreve Rodrigues.

Destacamos ainda o trabalho desenvolvido pela equipe do coordenador do Programa de Pós-Graduação em Metrologia da PUC-Rio, Carlos Alberto Hall Barbosa. Trata-se de uma técnica precisa e acessível para localizar objetos metálicos “perdidos” (como moedas e baterias) no corpo humano, tornando as cirurgias de remoção mais rápidas e eficazes

Outro tema interessante: o sistema agroalimentar foi responsável por cerca de um terço das emissões globais de gases de efeito estufa. No Brasil, essa proporção sobe para três quartos, o que o torna a principal fonte de emissões no país. Para alcançar as metas estabelecidas por tratados internacionais, como o Acordo de Paris, precisaremos transformar profundamente a forma como produzimos, processamos, distribuímos, acessamos, consumimos e descartamos alimentos. Como anfitrião da COP30, que começa em poucos dias, o Brasil tem a oportunidade de liderar o debate global sobre a mudança do clima, trazendo o foco para o sistema agroalimentar. É sobre isso que escrevem Cesar Favarão, pesquisador do Cebrap, e equipe.

Boa leitura! Bom fim de semana.

Daniel Stycer

Editor-chefe

Pornografia da morte: o Brasil que naturaliza e celebra imagens de violência racial

Leilane Menezes Rodrigues, Suffolk University

Há quem defenda que a exposição da violência pode promover justiça. Por outro lado, pesquisas indicam que a circulação em massa de imagens de brutalidade racial banaliza o sofrimento, normaliza-o e, com isso, reforça as estruturas de dominação branca.

Destaques

Bandido bom é bandido morto no atacado: a velha e ineficaz estratégia da segurança pública

Ignacio Cano, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

A estratégia de invadir territórios, matar suspeitos, apreender algumas armas e drogas, nunca conseguiu desarticular as facções criminosas, mas comprova a velha tradição da segurança pública de dobrar a dosagem quando o medicamento não mostra os efeitos desejados.

Em mais uma “megaoperação” desarticulada contra o crime no Rio, mais de 120 mortos e nenhuma solução

Pablo Nunes, Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC)

Desde 2020, o Rio de Janeiro teve cinco chefes de Polícia Civil, tendo um deles ficado no cargo por apenas 17 dias. Sinal claro de que falta um plano concreto para a segurança pública do estado

Análise: O crime organizado se tornou o maior negócio do Brasil - e sua mais séria ameaça

Robert Muggah, Instituto Igarapé

A economia criminosa do Brasil deixou os becos para ocupar também salas de reuniões, constar de balanços patrimoniais e cadeias de suprimentos essenciais

Opinião: Operação mais violenta da história do Rio expõe fracasso da política de segurança e um Estado infiltrado

José Cláudio Souza Alves, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

Não há como falar em combate ao crime se o crime está dentro da máquina pública. Do modo como vem sendo feito, o aumento da repressão ao tráfico só tem logrado aumentar o preço da droga, as pilhas de cadáveres nas favelas, e a concentração do mercado nas grandes facções

Outros destaques